A modificação dos padrões de vida em sociedade, aliada a uma crescente tomada de consciência ambiental, tem transformado substancialmente a relação entre humanos e animais. Com a urbanização, isolados em seus lares, verticalizados e diminuídos em raz ão da expansão das grandes cidades, os indivíduos têm estabelecido fortes laços afetivos com animais de estimação, os quais passam a ser vistos não mais como propriedade, mas como parte integrante da família. Os animais de estimação ganham cada vez m ais espaço. Dados recentes publicados pelo IBGE apontam que as famílias brasileiras já possuem mais cachorros e gatos do que crianças, e nesse novo cenário, em que impera o amor sem preconceito, não raro encontramos animais que ostentam a condição de filhos, de netos, de irmãos. Porém, os casais se separam, e com a falência da sociedade conjugal, recorrentemente o Poder Judiciário se vê às voltas de dividir o patrimônio, decidir sobre a guarda dos filhos, as visitas, a pensão. Vale-se, para tant o, de regras próprias que bem encaminham a resolução desses conflitos. Mas nesse novo cenário, como fica o pet? A afetividade deferida pelo casal ao seu animal de estimação não diminui ou desaparece com a dissolução do relacionamento conjugal, e car acterizando ponto comum de interesse dos humanos, esse animal não raro vira objeto de disputa e litígio. Se de um lado a Constituição Federal assentou o dever de defesa e preservação da fauna (art. 225, §1º, VII, CF), o legislador limitou-se a regula r essa proteção na esfera penal, e ainda de forma bastante generalizada. Assim, sem regulamentação legislativa, a dissolução de um núcleo familiar não raro reflete um impasse quanto à custódia e ao destino do animal de estimação desse casal. Na ausê ncia de regras sobre o tema, devemos continuar definindo a guarda desse integrante da família como se fosse um bem semovente? Apontando a insuficiência da postura tradicional, na esteira do que já vem sendo acolhido em muitos países, a autora apresen ta argumentos que demonstram a imperiosa necessidade de considerar o interesse do animal e preservar o seu bem-estar. Com base na doutrina ética do filósofo australiano Peter Singer, que considera a capacidade de sofrimento dos animais (senciência) c omo fator preponderante para consideração igual de interesses, discute-se a superação da dicotomia entre coisa e pessoa, a tendenciosa discriminação e o preconceito dos seres humanos em desfavor dos animais de outras espécies (especismo)